Cardeal Paulo Evaristo Arns: o Arcebispo da Esperança
O Regional Sul 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brsail (CNBB) teve acesso a um valioso artigo escrito por Maria Angela Borsoi, que serviu como secretária do Cardeal Paulo Evaristo Arns por 40 anos. Inspirada pelo tema do Jubileu da Esperança, ela nos presenteia com essa relíquia para a memória da Igreja.
“Neste primeiro mês do Ano Santo Jubilar de 2025 proclamado pelo Papa Francisco sob o lema “Peregrinos da Esperança” é gratificante voltarmos às memórias do pastoreio do Cardeal da Esperança, Dom Paulo Evaristo Arns, com um fato auspicioso: o jubileu áureo, no dia 25 deste mês, do acontecimento marcante na Igreja da grande metrópole, que foi a ordenação episcopal conjunta de quatro Bispos Auxiliares, na Catedral da Sé: dom Joel Catapan, SVD, dom Mauro Morelli, dom Angélico Sândalo Bernardino e dom Francisco Manoel Vieira. Corria o ano de 1975, igualmente Ano Santo sob o pontificado de São Paulo VI, e dom Paulo já era nosso Arcebispo por pouco mais de quatro anos, coadjuvado até então por dom Benedito Ulhoa Vieira, seu “primogênito” – como este gostava de lembrar – e pelos dois outros Bispos que herdara do governo de seu antecessor Cardeal Rossi: dom José Thurler e dom Lucas Moreira Neves.
A chegada simultânea dos quatro novos Bispos foi resultado dos diversos contatos que dom Paulo vinha mantendo com o Papa Paulo VI, desde sua nomeação para assumir a imensa Arquidiocese: já na primeira entrevista entre os dois, ao perguntar qual era o número de católicos em São Paulo, o Santo Padre lembrava ao Arcebispo que, na Igreja, a figura do Bispo deve ser como um sacramento em meio ao Povo de Deus; ele deve ser conhecido e visto pelos fiéis e que, portanto, na cidade de São Paulo, para cada milhão de habitantes ele deveria ter, ao menos, um Bispo Auxiliar. Com o prosseguimento das negociações e devido a então recente troca de Núncio Apostólico no Brasil, a aprovação de novos nomes demorou um pouco mais, o que acabou fazendo com que somente no ano seguinte, 1976, fossem nomeados mais dois: dom Luciano Mendes de Almeida e dom Antonio Celso Queiroz; e alguns anos mais tarde, ainda outros quatro: dom Décio Pereira, dom Fernando Penteado, dom Alfredo Novak e dom Antonio Gaspar. A celebração da qual comemoramos 50 anos neste janeiro foi histórica, porque pela primeira vez no Brasil, quatro Bispos foram ordenados numa mesma cerimônia, para a mesma Igreja Particular.
O privilégio de estarmos vivendo o Ano Jubilar sob o lema “Peregrinos da Esperança” é mais um oportuno motivo de regozijo e ação de graças, por isso evocamos o Cardeal cujo lema “De esperança em esperança” o notabilizou, na comunhão com o Colégio Episcopal que coordenou. Todos os seus projetos pastorais, gestos e atitudes foram iluminados e movidos pela marca bendita da Esperança.
Permanece na memória de quem teve o privilégio de com ele colaborar de perto, quanto dom Paulo gostava de explicar que considerava a Esperança a virtude teologal mais difícil de ser praticada. Dizia ele: “a Fé, a gente recebe com o leite materno, na intimidade do lar; a Caridade é o Amor espontâneo que se vai aprendendo e desenvolvendo a partir da prática cotidiana; mas a Esperança… esta é a mais difícil das três, pois é um risco para o futuro, exige sempre uma grande renúncia, principalmente à atitude burguesa da acomodação de quem consegue os bens e o conforto de que precisa e em seguida se mostra insensível à vulnerabilidade de seus semelhantes.”
Gostava também de evocar trocas e conversas com seu “Tio” dom Hélder Câmara, o qual lhe relatava que, ao se apresentar em auditórios estrangeiros, era comum ser questionado sobre as razões da sua esperança. E concluía a narrativa, comentando com o “Sobrinho”: “Quem se alimenta de Deus não pode deixar de esperar”!
Vale ainda lembrar, as inúmeras vezes que nosso Cardeal Arns deixou a marca da Esperança em seus escritos. Por exemplo, em seu livro “De esperança em esperança na sociedade, hoje”, lançado logo nos primeiros meses de seu governo pastoral em São Paulo; sua autobiografia ou livro de memórias, “Da esperança à utopia – Testemunho de uma vida”, publicado quando completou oitenta anos, em cuja Introdução ele cunhou a frase: “Em todas as partes deste livro encontramos o rosto da Esperança. Nelas existe sempre uma pessoa, um grupo, às vezes uma Igreja inteira sendo impulsionados pela Esperança fundamentada na cooperação humana e, assim, na graça do próprio Deus”; e no seu livrete de espiritualidade franciscana lançado em 2005, “Dez caminhos para a Perfeita Alegria”, do qual destacamos, no capítulo “Novidade da Esperança”, esta iluminada frase:
“Quem tudo abandona por causa de um ideal positivo dá um salto para dentro da esperança, ou seja, passa a viver nas asas dela, porque nada lhe resta mais, nem mesmo a segurança. E, quando desaparecem todas as seguranças, desaparece o chão sob os nossos pés. Ficamos no ar. Toda vez que nós, baseados na fé e no conceito de Deus, de Cristo e da Igreja, damos um salto no escuro, passamos a contar apenas com a luz da esperança, isto é, temos como recurso somente as asas dessa virtude e os meios que ela nos proporciona. Creio, porém, que fé e esperança se fundem, pois nascem da mesma raiz. E o acreditar fundamentado na esperança é que reaviva todo entusiasmo (pág.26)”.
Neste Ano Santo celebraremos, agradecidos, todas as sementes lançadas e plantadas entre nós pelo Cardeal da Esperança e seu Colégio Episcopal. Ambos fizeram história em São Paulo, com três de seus integrantes, Eméritos, ainda presentes entre nós!
Na foto em preto e branco, Dom Paulo impõe as mãos sobre dom Angélico (Catedral da Sé, 25 de janeiro de 1975).”
Por Maria Angela Borsoi